10 dezembro 2017

O CANÁRIO E O AMOR À CAMISOLA

O CANÁRIO

E O AMOR À CAMISOLA



Em tempos idos, na cidade de Penafiel existiam dois clubes de futebol e ambos tinham a sua orquestra.



Evidentemente que estes craques do antigamente, em que o futebol era verdadeiramente desportivo, que se suava a camisola e ainda por cima se levava para casa as camisolas, calções, meias para lavar e pontear, e as botas para engraxar ou concertarem às suas custas, devem de encher de risos Ronaldo, Messi & C.ª Lda., do nosso tempo.

 Orquestra- Jazz Albardófila do Sport. 


Todos os atletas eram amadores, tendo a sua profissão de ganha-pão e nas horas vagas davam dois chutos na bola e muitos deles ainda faziam parte da respectiva tuna musical do clube a que pertenciam tocando algum instrumento, mostrando o seu bairrismo, o gosto e a beleza de sentimentos, em suma o amor à camisola.



A figura que hoje vou falar é sobre o guarda-redes do Sport de cognome o Canário.

Bernardino com Soares dos Reis. Foto que me foi oferecida pelo meu amigo Neca Reis.




O Bernardino que era este o seu verdadeiro nome, teve a difícil tarefa de ir substituir debaixo dos postes Soares dos Reis que entretanto tinha ido para o Leça e mais tarde veio a ser guarda-redes do F. C. do Porto e da Selecção Portuguesa de Futebol, tal era a sua categoria.



Na altura o Bernardino morava naquelas casas que arderam no correr do Largo da Misericórdia, hoje Padre Américo.



À segunda-feira o equipamento todo amarelado, era dependurado ao sol, e quem passava no Largo ia dizendo e apontando que lá estava o equipamento do Canário a secar, para no próximo domingo entrar em campo equipado de amarelo.



Nesses tempos ainda não havia televisão e a rádio não estava vulgarizada, pelo que quem gostasse da bola, tinha mesmo que marcar presença no campo, e assistir aos desafios.



A estreia é sempre um jogo que marca qualquer atleta, seja de que modalidade for, e como tal aqui fica o relato do primeiro jogo do Bernardino na baliza do Sport Club de Penafiel.



Foi no domingo, 30 de Setembro de 1929, que se realizou na Vila da Lixa, o desafio entre o Foot-Ball Club da Lixa e o Sport Club de Penafiel.



A vitória sorriu ao Sport Clube de Penafiel, que deu uma cabazada de 6 bolas a 1.



Durante os 90 minutos, o Sport impôs o seu jogo habitual, marcando logo no início dois golos por intermédio de Gervásio, tendo o Club da Lixa reduzido ainda na primeira parte, para 2 – 1, resultado com que as equipas foram para o intervalo. 
 

Quando se previa uma segunda parte renhida, o Sport esmagou por completo qualquer aspiração dos locais, apontando mais quatro golos todos eles da autoria do seu avançado Lopes.



Neste jogo o Sport apresentou um elemento novo, Bernardino, que mostrou possuir qualidades para vir a ser um bom guarda-redes. Assim relatava o  jornal local "O Povo de Penafiel", de 6 de Outubro de 1929.





De exibição em exibição, foi cimentando nos sócios do Sport, a convicção que quando o Canário jogava, havia grandes possibilidades de saber quem ganhava mesmo antes do jogo se realizar, mas por vezes nem sempre se cumpria tal profecia.



Quando foi assediado para deixar o Sport rumo ao Académico do Porto, seu pai chamou-o e depois de uma longa conversa lá o convenceu que o Sport Club de Penafiel, era o melhor clube do mundo.



Não enriqueceu com a bola, mas para a catraiada que o admirava atrás da baliza, trouxe um inesquecível contentamento, e nela deixou o traço indelével da saudade.



Cada vez são menos, até porque a lei da vida também os tem ceifando, mas ainda hoje há quem me fale do Canário, quando por mim cruzam nas ruas desta cidade.